quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Indomável Sonhadora


Indomável Sonhadora, longa de estreia do diretor Benh Zeitlin, foi uma das maiores surpresas de 2012. Exibido pela primeira vez no Festival de Sundance, o principal evento do cinema independente norte-americano, a obra logo chamou a atenção da crítica e do público, sendo considerado como um dos destaques da mostra. A curiosidade sobre o filme aumentou ainda mais quando o diretor recebeu a Câmera de Ouro, prêmio do Festival de Cannes destinado a estreantes. Se não bastasse tudo isso, o diretor foi ainda indicado ao Oscar, com Indomável Sonhadora presente em cinco categorias, incluindo melhor filme. E não é para menos: mesmo debutando na função em um longa metragem, Zeitlin mostra segurança e talento, criando um filme belíssimo e emocionante.

Com um elenco repleto de atores amadores, Indomável Sonhadora é protagonizado por Hushpuppy (a espetacular Quvenzhané Wallis, com 5 anos na época das filmagens), uma menina que vive com o pai (Dwight Henry) numa área rural devastada pelo furacão Katrina. Vivendo em uma espécie de comunidade hippie, Hushpuppy tem de lidar com seu amadurecimento, aprendendo a enfrentar os medos, a doença do pai, a vontade de conhecer a mãe e as constantes tempestades que, de uma hora para outra, devastam toda a região.

Zeitlin usa esse contexto para criar uma obra profundamente ambientalista, destacando a relação homem/meio ambiente, mas sem nunca soar panfletário. Isso fica claro pela forma como o filme retrata seus personagens: morando em um lugar devastado pelo clima instável, em meio a destroços, carcaças e pouca higiene, em nenhum momento o roteiro - escrito pelo diretor em parceria com Lucy Alibar, baseado em uma peça desta última - vitimiza esses indivíduos. Pelo contrário: há entre eles um sentimento de liberdade e total comunhão com a natureza. Não é à toa que a protagonista faz diversas comparações entre aqueles humanos e os animais, sendo que os primeiros podem ser considerados as verdadeiras 'bestas' do título original. Lutando pela sobrevivência, eles não abrem mão de sua verdadeira natureza e não apelam para tecnologia ou ferramentas, seja para sobreviverem às tempestades ou para se alimentarem.



Mas o filme só funciona mesmo por causa da relação tocante entre Hushpuppy e seu pai. Trabalhando com uma atriz tão jovem, a equipe de produção sabe que deve apelar para efeitos que melhorem o desempenho de Wallis - e a montagem do filme é muito eficiente nesse ponto. Hushpuppy surge como uma figura impressionante, forte e animalesca, mas também sensível e repleta de dúvidas e questionamentos típicos de alguém de sua idade - e se há muito mérito da direção de Zeitlin em sua atuação, não se pode duvidar da expressividade de Wallis, que se destaca mais de uma vez ao longo da história. Da mesma forma, igualmente fantástico (e injustamente ignorado pelas premiações deste ano) é Dwight Henry, que caracteriza Wink, o pai da protagonista, como um sujeito alcoólatra, duro e que não se esforça para parecer carinhoso, mas que claramente se preocupa com a menina. Os momentos de interação entre pai e filha são os melhores de todo o longa, e a química entre Henry e Wallis é muito eficiente para demonstrar a necessidade mútua que um tem do outro.

Com um estilo de filmagem lírico e poético, beneficiado pela ótima fotografia de Ben Richardson e a maravilhosa trilha sonora criada pelo próprio diretor junto com o compositor Dan Romer, Indomável Sonhadora acompanha o amadurecimento de uma criança que, a partir de seu próprio ponto de vista, aprende a lidar com seus medos, dúvidas e a enfrentar as 'bestas' do mundo. Um trabalho de gente grande, inesquecível, que ajudou a revelar ao mundo os nomes de Benh Zeitlin e Quvenzhané Wallis.

Beasts of the Southern Wild (EUA, 2012). Dirigido por Benh Zeitlin. Com Quvenzhané Wallis, Dwight Henry, Levy Easterly, Lowell Landes, Palmela Harper, Gina Montana e Henry D. Coleman.


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